O potencial impacto da redução do consumo de sódio na saúde e na economia

A redução de sódio nos alimentos, industrializados ou não, é uma preocupação global e tema de campanhas de conscientização em muitos países. No Brasil, apesar dos esforços e conquistas na diminuição do consumo diário de sódio, a população ainda ingere muito sal. De acordo com um levantamento feito pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em 2019, o brasileiro ingere cerca de 9,34 gramas de sal por dia, sendo que o limite diário recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de 5 g (o que equivale a 2 g de sódio).

Um estudo recém-publicado no periódico BMC Medicine estimou o impacto em longo prazo da redução de sódio em alimentos industrializados na saúde dos brasileiros, concluindo que, até 2032, a medida seria capaz de prevenir cerca de 110.000 casos de doença cardiovascular em homens e 70.000 casos entre mulheres.

“O levantamento demonstrou que mais de 27.000 mortes por doenças coronarianas e acidentes vasculares cerebrais poderiam ser evitadas ou adiadas se os brasileiros consumissem, em média, menos de 2 gramas ao dia de sódio”, escreveram os autores.

O estudo também previu o efeito econômico da aplicação das metas de redução de sódio em produtos embalados entre 2013 e 2032.

Essa política poderia produzir uma economia líquida de, aproximadamente, 220 milhões de dólares em custos médicos para o Sistema Único de Saúde (SUS) no tratamento de casos de doença cardiovascular e acidente vascular cerebral (AVC), e uma economia em custos informais de cerca de 71 milhões de dólares (95% UI: 17 a 170 milhões de dólares).

Quase dois terços dos casos e das mortes por doenças cardiovasculares evitáveis a partir da implementação dessa política, entre 2013 e 2032, se dariam em pessoas entre 50 e 69 anos.

As análises foram feitas em parceria por cientistas e pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da University of Liverpool, no Reino Unido. O grupo tomou por base um acordo entre o Ministério da Saúde e a indústria alimentícia, assinado em 2011, que previa reduções voluntárias na média de sódio contida em alimentos processados e ultraprocessados. Com validade até 2017, o pacto sugeriu cortes a partir de 8% até pouco mais de 30% na média de sódio em cerca de 34 categorias de alimentos.

O modelo desenvolvido para fazer as previsões considerou as mudanças na composição dos alimentos por meio de dados de pesquisas oficiais de rotulagem de 2013 a 2017. As variações na ingestão de sódio foram modeladas usando microdados da Pesquisa de Orçamentos Familiares Brasileiros de 2002/2003 e 2008/2009. Os custos de internação por doença cardiovascular e AVC no SUS foram obtidos em tabelas do Sistema de Informações Hospitalares (SIH) do SUS. As tabelas disponíveis do Sistema Nacional de Saúde no tratamento das doenças cardiovasculares e mortes evitáveis ao longo de 20 anos (2013-2031), estratificados por idade e sexo, foram consultadas para estimar custos.

Na discussão, os pesquisadores observam que a redução estimada de 0,1 g no consumo diário de sódio de 2011 a 2017, alcançada pelas metas voluntárias do Brasil, foi modesta em comparação a de países como Finlândia (1,6 g/dia), Japão (1,2 g/dia) e Reino Unido (0,52 g).

Uma revisão sistemática também evidenciou aspectos centrais para o planejamento de intervenções no Brasil. Segundo os autores, enquanto em países como o Reino Unido cerca de 80% do sódio dietético é proveniente de alimentos processados ​​e ultraprocessados, no Brasil, esse tipo de alimento responde por aproximadamente 35% da ingestão de sódio, com mais de 55% do consumo associado ao sal de cozinha adicionado durante o preparo dos alimentos.

De acordo com os cientistas, “atingir as metas recomendadas pela OMS exigirá uma estratégia abrangente mais eficaz, incluindo reformulação, para promover uma redução mais significativa do sódio em todo o espectro de fontes de sódio na dieta da população brasileira”.

O trabalho aponta ainda a necessidade da continuidade das ações de redução do sódio pactuadas com a indústria alimentícia. Como descreveram os autores, “as metas voluntárias brasileiras de sódio podem gerar impactos econômicos e de saúde substanciais. A redução na ingestão de sódio que provavelmente foi alcançada a partir das metas voluntárias indica que a redução de sódio no Brasil deve ir mais longe e mais rapidamente para atingir as metas nacionais e da OMS para a ingestão de sódio”.

“Mais casos de hipertensão e mortes podem ser evitados se o Brasil adotar políticas obrigatórias, e não apenas voluntárias, de redução de sódio em alimentos industrializados, envolvendo mais categorias e limites ainda menores. Além disso, considerando as recomendações do Guia Alimentar para a População Brasileira, reduzir o consumo de alimentos ultraprocessados e de sal de mesa também são medidas importantes para atingir as recomendações da OMS”, disse um dos autores do estudo, o cientista Eduardo Augusto Fernandes Nilson, doutorado em Saúde Global e Sustentabilidade pela USP, em entrevista à Agência Bori.

 

Fonte: Medscape